Em recente decisão do STJ, EAREsp 1.459.849 sobre a definição se o reembolso aos beneficiários de planos de saúde é cabível quando o atendimento é realizado fora da rede credenciada em situação de não urgência ou emergência, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino se manifesta da seguinte forma:
"Nunca atentei especialmente para esta distinção quanto à necessidade de ter ou não emergência. O que sempre pareceu relevante é que o reembolso se fizesse dentro da tabela estabelecida unilateralmente pelo plano. A satisfação desse requisito é por si suficiente para assegurar equilíbrio na relação de consumo nesses contratos".
Ao ler esse trecho da decisão mais uma vez fiquei estarrecida com a posição do juízo. Veja, não estou dizendo aqui que o juízo não deve ter opinião sobre o tema, pelo contrário, deve sim julgar a matéria. Meu ponto aqui é sobre quando vemos julgamento baseado em opinião. Sim, porque a manifestação acima é definitivamente uma opinião. Não deveria ser parâmetro para julgar matéria de subscrição de risco.
Nesse artigo trago algumas provocações que, longe de ser uma visão completa, apresentam a questão sob outra perspectiva, relativas aos aspectos técnicos da subscrição de risco e precificação, matéria que é de competência do atuário especialista em saúde suplementar.
1) Na hipótese proposta, como seriam verificados se os valores de reembolso correspondem de fato aos valores de pagamento da rede de prestadores?
2) Por quem seriam suportados os custos operacionais de pagamento direto ao cliente final? Vamos combinar que certamente traz maior complexidade administrativa do que pagar de forma centralizada aos prestadores credenciadora?
3) Um beneficiário de plano certamente não terá habilidade de justificar tecnicamente o procedimento realizado, assim, se na opinião técnica do corpo clínico do agente pagador, a operadora de planos, entender que o procedimento não é necessário ou é inadequado para o diagnóstico apresentado, como poderá a operadora argumentar com o beneficiário se o reembolso é apresentado a posteriori da realização do procedimento? Podemos afirmar que esse processo traz custo assistencial igual ao que se teria em atendimento em rede credenciada?
4) Nos casos que o contrato prevê medidas de regulação, como autorização prévia, o faz com Um propósito claro, o de gerir o risco assumido, garantido para o coletivo de pessoas do fundo de mútuo a assistência contratada. Quando o beneficiário usufruindo plano por meio de reembolso não ocorrem essas estampas de gestão, como então poderíamos afirmar que há equilíbrio na relação?
Percebo com muita clareza o quanto o atuário especialista em planos de saúde pode contribuir na elucidação de aspectos específicos do risco assumido e os resultados de utilizar esse recurso por meio da assistência técnica pericial ou mesmo por meio de uso de laudos atuariais que venham a trazer clareza sobre outros aspectos técnicos que não são inerentes a legislação, mas sim à subscrição de risco e precificação dos planos.
São inúmeros os aspectos a serem considerados e a competência e conhecimento alheio deve ser reconhecido e respeitado. O IBA, como Instituto Brasileiro de Atuaria, órgão máximo que representa os atuários no Brasil é um excelente canal para busca de contribuições técnicas sob a forma de amicus curiae, pois se manifesta de forma imparcial, construindo sua posição a partir de um processo transparente e com governança, onde as contribuições são construídas a partir de um colegiado de membros qualificados. Por outro lado, as próprias operadoras de planos de saúde podem lançar mão de laudo atuarial que suporte o recurso a ser apresentado.
Um laudo atuarial corresponde a documento emitido por atuário habilitado e certificado como MIBA, Membro do Instituto Brasileiro de Atuária, que conterá a análise da questão apresentada na inicial do processo e a aplicação do conjunto de regras de negócios que são compatíveis com a regulamentação existente e que impactam na demanda apresentada, elucidando sob o ponto de vista de do risco assumido, da precificação realizada para o plano em questão e das reservas necessárias para a manutenção de seu equilíbrio ao longo do tempo.
Raquel Marimon
Diretora Executiva
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Data da notícia:
27/10/2020